Por que o H1N1 não parou as economias como fez o Coronavírus?

Para conter a pandemia do novo coronavírus, um terço da população mundial vive hoje sob medidas de isolamento, que fecharam lojas, aeroportos, empresas, atividades culturais e esportivas obrigando as pessoas a ficar em suas casas.

Isso é inédito na história recente e não foi visto nem quando o mundo enfrentou outra pandemia devastadora pouco tempo atrás.

A gripe suína também era causada por um novo vírus que passou por uma mutação em animais e começou a infectar humanos, em quem causa uma doença que pode ser grave. Entre 2009 e 2010, mais de 200 países tiveram casos confirmados da primeira pandemia do século 21.

Mas o H1N1 não colocou cidades ou nações inteiras em quarentena. Em alguns países, viajantes passaram por triagens, casos suspeitos foram isolados, e aulas chegaram a ser suspensas, mas a disseminação daquele vírus não chegou a praticamente paralisar algumas das maiores economias do mundo como vemos agora.

Afinal, essas respostas drásticas ao novo coronavírus se justificam? Ou há um exagero?

O novo coronavírus é mais transmissível do que o H1N1…

Em abril de 2009, o H1N1, um subtipo inédito de vírus influenza, que causa a gripe, foi identificado no México e nos Estados Unidos. Quatro meses depois, ele havia se disseminado para mais de 120 países e deixado dezenas de milhares de pessoas doentes.

Assim como o COVID-19, o novo H1N1 era transmitido por meio de tosse e espirros ou pelo contato direto com uma pessoa infectada e com secreções respiratórias. 

Mas o H1N1 era duas vezes menos transmissível do que o novo coronavírus. A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que uma pessoa com H1N1 era capaz de infectar de 1,2 a 1,6 pessoas.

O índice para a COVID-19 varia bastante de local para local. Mas um estudo recente, usado como referência pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças da Europa, revisou 12 pesquisas sobre o tema e apontou uma taxa intermediária de 2,79.

No entanto, sua rápida disseminação tem levado epidemiologistas a revisar o índice e a sugerir que ele é maior do que 3, disse o cientista Neil Ferguson, do Imperial College London, no Reino Unido.

“Isso fornece ainda mais evidências que apoiam medidas de distanciamento social mais intensas”, afirmou Ferguson à revista New Scientist.

… e mais letal também

A OMS estima a taxa de letalidade do Sars-Cov-2 em 3,4% (do total de doentes). Fernando Spilki, presidente da Sociedade Brasileira de Virologia (SBV), diz que ela é ainda maior em algumas regiões do mundo.

“Em Bergamo, na Itália, fica na faixa de 12%. Se pensarmos que, com a gripe comum, temos de 1% a 2% entre pacientes com idade mais avançada, o que já é alto, isso que estamos vendo agora é assustador”, diz ele.

No entanto, cientistas alertam que esse valor pode ser menor, porque só uma minoria da população tem sido testada. Muitas pessoas assintomáticas ou com sintomas leves não estariam entrando para as estatísticas oficiais de casos confirmados, o que produziria uma taxa de letalidade maior do que a real.

Consultores científicos do governo britânico apontam, por exemplo, que essa taxa está provavelmente entre 0,5% e 1%.

Porém, Spilki afirma que só será possível saber qual é o índice exato se a testagem for ampliada, o que, no momento, não pode ser feito, porque faltam materiais para exames.

“O sistema de diagnósticos está saturado. Todos os países estão tentando testar ao máximo, e isso elevou demais a demanda”, afirma o presidente da SBV.

Ainda assim, mesmo que a taxa do novo coronavírus seja de 0,5% a 1%, seria muito maior do que a da pandemia de H1N1, que é estimada em 0,02%, segundo um estudo liderado pela cientista Maria Van Kerkhove, da OMS.

Isso torna essa pandemia mais grave do que a anterior

Esses dois aspectos — as maiores transmissibilidade e letalidade do Sars-Cov-2 — se refletem nos números oficiais da OMS sobre as duas pandemias. A agência contabilizou em quase 16 meses da pandemia de H1N1 mais de 493 mil casos confirmados e de 18,6 mil mortes.

A pandemia atual ainda não completou três meses e já superou o número de infecções e vítimas fatais da anterior. Até 29 de de março, a OMS contabilizou 571,6 mil casos confirmados e 26,4 mil mortes.

Um terceiro fator é importante para explicar os números desta pandemia em relação à de 2009: nenhuma pessoa tem imunidade contra o Sars-Cov-2, ao contrário do H1N1, que afetava menos idosos do que uma gripe comum.

… e não vai dar para fazer uma vacina tão rápido quanto antes

A pesquisa de uma vacina contra o COVID-19 vem avançando rapidamente, e há mais de 20 versões em desenvolvimento. Mas ainda é preciso garantir que funcionam e são seguras. E, mesmo que alguma se prove eficaz, será preciso ter formas de produzi-la em massa.

Com isso, as previsões mais realistas dizem que uma vacina contra o novo coronavírus não estará disponível ao menos até meados do próximo ano.

Na pandemia de 2009, as perspectivas eram mais otimistas, porque já havia uma vacina contra outros vírus influenza. Foi uma questão de adaptar o que existia para criar uma versão capaz de conferir imunidade contra o H1N1, e foi possível aplicá-la na população a partir de novembro daquele ano.

O número de novos casos já havia caído em todo o mundo àquela altura, mas isso foi importante no controle da pandemia a partir de 2010 e permitiu à OMS declarar seu fim em agosto daquele ano.

E também para proteger a população daquele subtipo de H1N1 desde então — a vacina oferecida no Brasil neste ano, por exemplo, confere imunidade contra ele.

E a economia?

As características únicas do Coronvírus fazem com que seja muito difícil qualquer prognóstico para as economias. O que se sabe é que com a quarentena, muitos negócios estão demitindo trabalhadores ou falindo diante de um fluxo de receita que caiu em mais de 80% para alguns setores.

O Coronavírus é muito contagioso e a vacina irá demorar. Isso piora ainda mais a situação, porque novos surtos podem surgir, fazendo com que sejam necessárias novas medidas de lockdown. No entanto, o impacto poderia ser menor, porque daria tempo para o sistema público de saúde se recuperar.

As empresas em média conseguem sobreviver de 20 a 30 dias com um faturamento zero. No entanto, caso o pico da epidemia demore para chegar, os impactos serão ainda mais fortes para os negócios e para a economia mundial. A FGV, por exemplo, está estimando uma recessão de mais de 4% na economia brasileira.

Nos Estados Unidos, o número de entradas no seguro desemprego cresceu 1500% em 1 semana. O Goldman Sachs está estimando uma queda de 34% no PIB trimestral e um desemprego de 15%, prognósticos terríveis para a economia norte-americana. Tanto é que, para combater isso, o congresso aprovou US$ 2 trilhões de dólares como incentivo.

O certo é que quanto mais demorar a epidemia, mais grave será a recessão. 

Matéria adaptada do G1, escrita pela BBC.

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